quinta-feira, 28 de março de 2024

MATURIDADE E ESCOLHAS - Prof. Renato Dias Martino


E AS ESCOLHAS?

Acredita-se que para escolher, se tem liberdade.
Mas, a escolha não passa de um delírio de vaidade. 
Quando a escolha é bem-sucedida de verdade,
não foi uma escolha, mas o único caminho na realidade.
 Quando se está num acordo com o fato, 
não se tem escolha, mas é do 'Todo' a vontade.

DUAS PONTES

Quero propor uma alegoria, quero fazer uma pausa e retornar a essa alegoria no final da explanação. Vamos conjecturar aqui, que vocês vão ganhar, vão conseguir uma coisa que vocês desejam muito. Para conseguir essa coisa que vocês desejam muito, vocês têm que ir em certo lugar o mais rápido possível, o quanto antes, porque se você demorar muito para chegar nesse lugar, pode ser que você não consiga isso que você deseja muito. No caminho para esse lugar, para conseguir isso que você deseja muito, tem um rio muito perigoso. Um rio onde muitas pessoas morreram até, de tão perigoso que é este rio. Para cruzar esse rio você tem a “ponte A” e a “ponte B”. A “ponte A” vai te levar para este lugar, para esse teu objetivo, para você conseguir o que você tanto deseja, está condenada. A estrutura dela, muito provavelmente, não aguenta o peso de uma pessoa. Só que essa ponte te leva para este lugar, que você precisa chegar para conseguir o que você deseja, com muita rapidez. Um caminho curto. E tem uma outra ponte, a “ponte B”, que é uma ponte segura, que aguentaria dez pessoas, tranquilamente. Muito bem estruturada. Só que este caminho iria demorar mais. É um caminho mais longo para chegar até onde você precisa ir para conseguir aquilo que você tanto deseja e pode ser que você não consiga chegar se você pegar este caminho na “ponte B” e você tem que escolher. Qual ponte você pega? Eu vou dar uma pausa nessa história e nós vamos retomar essa história no final da nossa conversa aqui.

A VIDA É FEITA DE ESCOLHAS

Se a gente fizer uma breve pesquisa aí na internet, a gente vai encontrar inúmeras afirmações de que a vida é feita de escolhas. Dentre as pesquisas aqui, eu encontrei esta frase muito interessante de uma pessoa chamada Vitória Demante. A frase dela é assim: “A vida é feita de escolhas e uma hora você é obrigado a escolher o que quer, seja certo ou errado.” A gente idealiza o poder de escolha, a liberdade de escolha. Tem até a ideia de que o poder de escolha faz um sujeito bem-sucedido. Um sujeito bem-sucedido é aquele que tem o poder de escolha, que tem liberdade de escolha. E por outro lado, o sujeito fica muito desconfortável quando ele não pode escolher. Quando ele é obstruído de fazer as suas escolhas. 

IMPEDIDO DE ESCOLHER

A nossa vida cotidiana nos obriga a escolher, a decidir. A escolher, a decidir o que é certo, o que é errado. Esse critério é uma lei. Além disso, o sujeito que tem a liberdade de escolha se sente onipotente. Ele pode tudo! O sujeito que pode escolher pode tudo e quando ele não pode escolher ele se sente inseguro, se sente fracassado. Quando a gente é impedido de escolher, a gente acaba até se enfurecendo, sendo muitas vezes hostil, se revoltando.

ESCOLHA INCONSCIENTE 

Nós estamos falando de psicanálise aqui. Não estamos falando? Qual que foi a primeira e maior descoberta do Freud? O inconsciente. Não é isso? a ideia da instância inconsciente da mente a parte consciente da mente é ínfima é muito pequena como é que a gente pode ser psicanalista e acreditar na escolha lá em 1917, em UMA DIFICULDADE NO CAMINHO DA PSICANÁLISE, o Freud coloca assim o ego não é senhor da própria casa ou seja o “eu” não escolhe, ele simplesmente, sai correndo atrás de justificar aquilo que foi escolhido que não tem consciência e nunca terá.

VONTADE DE VIVER

Antes do Freud trazer a ideia do inconsciente, o Schopenhauer já falava disso. Schopenhauer falava da VONTADE DE VIVER. O que comanda o sujeito, o que rege o sujeito é a vontade de viver. Direciona o sujeito para onde ele for. É o que move o sujeito, é o que orienta o sujeito e a vontade de viver é inconsciente. Eu não sei o porquê, eu não sei o porquê eu estou caminhando para essa direção. Eu só estou caminhando para essa direção, depois a gente sai atrás tentando encontrar justificativas do porquê você está andando para aquele lado. O motivo real não está dentro da consciência do sujeito, não está dentro da possibilidade do sujeito saber.


DESEJO 

Quando o sujeito deseja alguma coisa... E aí, se a gente está falando de desejo a gente está falando daquilo que o sujeito vai escolher. Ele escolheu porque ele deseja aquilo. O sujeito deseja alguma coisa, não porque na realidade, ele quer aquilo, mas porque aquilo foi impedido para ele em certo tempo da vida dele. Ele foi impedido de fazer alguma coisa e agora isso se tornou um desejo para ele. Quando o sujeito deseja alguma coisa, aquilo ali está cheio de “eu não podia isso”, “eu fui impedido disso”. Muitas vezes, uma revolta, tentando conseguir isso daí, para provar para si mesmo que, agora ele pode, ou ainda, conseguir aquilo para ter aprovação do outro. Ele deseja algo, não para ele, mas ele deseja algo para que as pessoas o desejem o desejo. Não é genuinamente do sujeito. O primeiro desejo do da criança é que ela seja desejada pela mãe. Porque, se ela for desejada pela mãe ela está garantida. Ela passa a existir a partir do olhar da mãe. O primeiro e o maior desejo é o de ser desejado e não vai deixar de ser. Esse desejo vai se transformando, mas a essência continua sendo a mesma. Então, o desejo, ou é porque ele foi impedido, ou seja, elemento reprimido, ele foi impedido de alguma coisa e agora ele deseja isso a qualquer custo, se revolta contra essa proibição e agora ele quer ou ele deseja para ter a prova do outro aprovação do outro, ou ele deseja alguma coisa para se isentar de um sentimento de culpa, também. Mas, de qualquer forma não é dele. Não é genuinamente dele esse desejo.

DE GERAÇÃO PARA GERAÇÃO 

Então, o desejo do outro é genuíno? Porque, se o desejo do sujeito é o desejo do outro, então, o desejo do outro é genuíno? Não! Não é! Porque vai passando de geração em geração, uma certa incapacidade de tolerar e desconfortos, ao ponto de renunciar a esse desejo que não era dele e ele vai empurrando de geração para geração. O vô não conseguiu, empurrou para o pai, o pai não conseguiu, empurra para o filho, que empurrará para o neto, até que um, por assim dizer, “mate no peito” e diga: “daqui não vai passar, eu vou renunciar a esse desejo”.

DOIS MOTIVOS PARA ESCOLHER

Então, a gente chega num ponto onde dois motivos, ou a vontade que é a necessidade do id, inconsciente, que impulsiona o sujeito para um caminho sem que ele tenha consciência de porque ele está seguindo aquele caminho. Assim como Freud colocou, assim como Schopenhauer falava da VONTADE DE VIVER, que impulsiona o sujeito, ou o desejo que é do outro. É isso que faz o sujeito escolher. Um é da pulão de vida, da VONTADE DE VIVER e a outra é de um desejo reprimido, que foi empurrado para ele, projetado nele e agora ele tem que sair correndo atrás para resolver.

LIVRE ARBÍTRIO

A gente tem o conceito do livre arbítrio. Não é a gente? Tem na filosofia. O próprio Schopenhauer fala do livre arbítrio, Espinoza fala do livre arbítrio. Dentro do vértice místico-religioso, nas formulações religiosas, a gente tem também. Deus dá o livre arbítrio. Não é isso? No entanto, o que é o livre arbítrio? O que é o poder de escolha? É aquilo que vai fazer com que você viva uma experiência para que você possa ter consciência de que você, enquanto escolhendo, estava iludido. O livre arbítrio é uma chance de você viver a experiência de escolher e perceber que, na verdade, ao escolher, você estava iludido. Porque, a escolha não é tua. Se eu não posso escolher, eu também não tenho responsabilidade quanto a isso. É aí que entra o problema. Apesar de você não poder escolher, a responsabilidade é sua. Você precisa responder por aquilo.

AMOR FATI

Aí, entra uma formulação filosófica importante do Nietzsche. Lá no HUMANO DEMASIADO HUMANO, 1878, ele propõe a ideia do AMOR FATI. O que o Nietzsche quer dizer com AMOR FATI? Amar o fato, amar a realidade, independente do desconforto que essa realidade possa trazer. “Minha fórmula para a grandeza no homem é amor fati: nada querer diferente, seja para trás, seja para a frente, seja em toda a eternidade. Não apenas suportar o necessário, menos ainda ocultá-lo – (...) – mas amá-lo...”

AMOR

O que eu estou chamando de amor e o que que o Nietzsche estava querendo propor como amar. Amar não é gostar. Gostar é uma coisa, amar é outra. Amar é doar-se, dedicar-se, mesmo que não goste. Se você perguntar para uma mulher o que que ela espera de um homem, ela vai dizer assim: “que ele goste de mim”, não que ele tenha a capacidade de me amar. Você percebe como que o desejo é de ser desejada e não que alguém se dedique a mim? Porque, uma coisa não tem nada a ver com a outra. Eu gosto de alguma coisa porque aquela coisa me traz um benefício e eu amo alguma coisa porque eu beneficio essa coisa. Então, amar a realidade é dedicar-se à realidade não é gostar da realidade. Não adianta, porque você não vai gostar da realidade. Quanto mais você tiver clareza da realidade, quanto mais você estiver num acordo com a realidade, menos você vai gostar da realidade e mais você precisa se capacitar para amar esta realidade. E enquanto de acordo com a realidade, não existe escolha, porque a realidade é uma só, porque o caminho é um só, não tem dois. O amor verdadeiro é aquele que diz respeito a doar-se ao outro, a renunciar de desejos, a adiar vontades, a sacrificar-se pelo outro. Não quer dizer desejar o outro, não quer dizer estar fascinado com o outro, não quer dizer se sentir atraído pelo outro. Isso não é amor. Isso é paixão. 

AMAR É UMA ESCOLHA

E aí você vê ali assim na rede social: “amar é uma escolha”. Não, amar não é uma escolha. “Amar é uma decisão” Não, amar não é uma decisão. Amar é uma capacidade e uma capacidade que precisa ser desenvolvida. Se o sujeito não estiver sendo capaz de amar ele não pode amar, mesmo que ele escolha amar. Ninguém escolhe se dedicar a alguém ou não. Ou ele é capaz daquilo ou ele não é.

FORMULAÇÕES RELIGIOSAS

Aí mais uma vez a as formulações religiosas a gente vai encontrar lá: “amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, e de toda a tua alma, e de todo o teu pensamento. Este é o primeiro e grande mandamento. E o segundo, semelhante a este, é: Amarás o teu próximo como a ti mesmo.” Aí você vai encontrar em Mateus, 22:37,38,39, vai encontrar em Marcos, 12:30 e Lucas, 10:27. Não sou pastor, não estou aqui pregando. Não é nada disso! É simplesmente, mais uma possibilidade de ilustração, dentro de uma literatura riquíssima que são as escrituras bíblicas. Um modelo. O que que é amar a Deus sobre todas as coisas? É amar a realidade. Então, amar a Deus sobre todas as coisas e o AMOR FATI de Nietzsche, estão ali coincidindo. E o sujeito não precisa acreditar em Deus, ele pode ser ateu. Então, ele pode seguir o AMOR FATI e não o mandamento de Jesus Cristo. Amar aquilo que está fora das suas expectativas, que não depende do seu desejo. Por mais que a gente fale que este é um mandamento de Jesus Cristo, ninguém ama porque mandaram ele amar. Isso é absurdo! Ninguém ama porque escolheu amar, ninguém ama porque decidiu amar, ninguém ama por ser obrigado a. Você pode até fingir que você está amando, mas não é verdadeiro. A capacidade de amar só vai começar a acontecer a partir do momento que você for qualificado para isso. Como é que se qualifica para amar? Como é que o sujeito pode se qualificar para amar? Sendo amado! Não tem como aprender a amar sem ter sido amado. Eu aprendo a amar a partir do amor do outro e o outro faz parte da realidade. O outro faz parte dessa realidade que eu não controlo. Então, quando eu sou amado por esta realidade, que está independente da minha expectativa, eu passo a ter um relacionamento com essa realidade. Eu passo a ser capaz de amar esta realidade. Mas primeiro eu precisei ser amado, para criar um vínculo com essa realidade. Eu sou amado por essa realidade, aprendo a amar a mim mesmo, a partir desse amor que eu tive da realidade e agora eu devolvo esse amor. Eu retribuo esse amor para a realidade. Não é uma moeda de troca, é um processo.

AMAR O OUTRO

Lá em 1914, SOBRE O NARCISISMO UMA INTRODUÇÃO, Freud vai dizer assim: “um verdadeiro amor feliz”... ele vai chamar de amor feliz, talvez ali num erro de tradução, ou ainda numa colocação não muito adequada, porque amor e felicidade são dois conceitos que não estão juntos. Porque, se amor é renúncia ninguém é feliz renunciando, se amor é abrir mão da satisfação, ninguém é feliz insatisfeito. Mas, de qualquer forma, ele coloca lá que o amor feliz é quando a libido do ego corresponde a libido objetal. Ou seja, quando, o quanto eu amo a mim mesmo coincide com quanto eu amo o outro. E Olha que bacana! Se, no primeiro mandamento de Jesus Cristo, “amar a Deus sobre todas as coisas”, coincide com a colocação ali do Nietzsche, do AMOR FATI, amar o outro como a si mesmo, coincide com a colocação do Freud, que um amor feliz seria amar a si mesmo, assim como ama o outro.

MOEDA DE TROCA

Se você for grato você vai ter uma vida próspera. Então, eu vou ser grato para ter uma vida próspera. Não é assim! Não é uma moeda de troca. Ser grato é uma capacidade. Quando eu for capaz de ser grato, a minha vida vai começar a prosperar. Uma vida de fartura se inicia com um ato de generosidade, mas eu não posso ser generoso para ter uma vida de fartura. Ser generoso não pode ser uma atitude esperando uma recompensa. Por que, senão, não é nobre, senão, não é real. Eu preciso ser capaz de desenvolver a generosidade e a partir dessa generosidade, da minha atitude generosa, a minha vida começa a ser farta. Mas, por outro lado, eu só vou conseguir ser generoso, se um dia foram generosas comigo. Se não foram generosos comigo, eu não consigo desenvolver a generosidade com o outro. Então, tudo se inicia no colo da mãe. “Ah! ó o clichê da psicanálise”. Pois é! Por isso que a psicanálise faz tanto sentido. A mão que balança o berço move a nação. Uma mãe generosa, configura uma personalidade generosa, que sendo generosa irá configurar, por sua vez, uma vida de fartura. “Ah! Mas é só com a mãe?” Não! Nós somos psicanalistas. Então, a gente tem ali, a possibilidade de configurar um ambiente emocional-afetivo saudável para que possa haver experiências reparadoras nesse nível. Há uma esperança, por mais que eu possa não ter tido isso no seio do lar. Esse é o papel da psicanálise, propor um ambiente reparador dentro do nível emocional e afetivo.

DESINTEGRAÇÃO

A escolha está subordinada à ilusão. Enquanto escolhendo estou iludido. E a ilusão tem a suas consequências e eu preciso arcar com essas consequências, ou então empurrar para próxima geração. Escolher diz respeito a desintegração. DECISÃO! “D” quer dizer cortar e cisão reafirma este corte. Então, cada vez que eu decido, eu estou cindindo, desintegrando. E cada vez que eu renuncio de decidir eu estou integrando, estou integrado e estou me integrando com o todo. Porque é do todo a vontade e não minha. Porque é do todo a escolha e não minha. E como é que eu me conecto com o todo? A partir do meu inconsciente. A partir daquilo que é mais primitivo em mim. A partir da minha vontade de viver. Dentro da formulação religiosa, “seja feita a vossa vontade”. E mais uma vez, não sou o pastor, não estou aqui tentando pregar religião alguma, mas estamos trazendo mais uma ilustração, que é dentro das escrituras bíblicas do cristianismo. Que é extremamente rica.

MATURIDADE E ESCOLHA

Então, a maturidade traz a liberdade de escolha? Não! É o contrário. Quanto mais amadurecido emocionalmente você vai ficando, mais você vai tendo clareza da realidade, que o caminho é um só e não tem escolha. Quanto mais você amadurece emocionalmente, mais integrado você fica com seu instinto de autopreservação, que é a coisa mais primitiva que uma criatura pode ter e este instinto de autopreservação vai te mostrar o caminho que é um só.

PARA O INTOLERANTE

Para o sujeito que não tolera desconfortos, para o sujeito que não aprendeu a tolerar frustrações, ou ainda, para o sujeito que não está sendo capaz de tolerar frustrações é melhor acreditar que ele é livre para escolher. E aí, a realidade é aquilo que eu quero que seja, independente do que ela é na realidade. Se eu decidir que eu sou um cachorro agora, eu vou começar a latir e todo mundo precisa começar a me chamar de cachorro, porque se não me chamar de cachorro, eu vou protestar, vou mandar aprender. Independente da natureza da biologia estar escancarando na minha própria cara que eu sou um ser humano. Eu vou começar a latir e todo mundo vai ter que engolir.

AINDA SOBRE AS DUAS PONTES

Voltando na proposta da alegoria. Então, qual o caminho que eu devo escolher? O da “ponte A”, ou o da “ponte B”. A “ponte A” é uma ponte que está danificada. Muito provavelmente não aguentará o peso de uma pessoa, mas ela é um atalho e te leva mais rápido para o ponto, para você conseguir aquilo que você tanto deseja. A “ponte B” é uma ponte bem estruturado e aguentaria aí umas dez, vinte pessoas, numa boa. Mas você demoraria mais para chegar ao ponto para conseguir aquilo que você deseja e poderia correr o risco de não chegar a tempo. Embaixo da ponte, um rio extremamente perigoso, onde morreram várias pessoas. Qual ponte você escolhe? A “ponte A”? Você pode escolher. Não pode? É tua escolha! É o livre arbítrio! Para conseguir o seu desejo, muito provavelmente você vai escolher a “ponte A”, mas se você for capaz de renunciar o seu desejo. Não é de maneira alguma dizer não vou conseguir isso que eu desejo, mas é ser capaz de ser prudente o suficiente para não arriscar a sua vida, para obter aquilo que você deseja. E se você tiver de acordo com esta realidade que inclui, o instinto de autopreservação, não tem escolha o caminho é um só é a “ponte B”. Segura!

VERDADEIRO EU

Ninguém escolhe como quer ser e então,
passa a ser o que escolheu.
Na melhor das hipóteses,
pode vir a reconhecer
como esteja sendo e assim,
poderá aprender a respeitar
e se responsabilizar pelo verdadeiro eu.



quarta-feira, 20 de março de 2024

EVOLUÇÃO DA RAÇA HUMANA - Prof. Renato Dias Martino


Não acredito que a humanidade esteja evoluindo. A tendência de uma raça que prolifera descontroladamente como é o caso do ser humano, é o rebaixamento da qualidade do indivíduo. Os bebês teriam que ser mais bem cuidados pelos seus pais e não é isso que está acontecendo. Seres humanos sendo colocados no mundo sem o menor cuidado, sem a menor dedicação para evolução. Então, não é possível que uma raça possa evoluir sem que seja cuidada adequadamente. Pelo contrário, a gente vai despejando seres humanos sem o menor cuidado e esses seres humanos vão trazendo uma configuração nociva para própria sociedade e para própria espécie em si.

QUALIDADE DO SER HUMANO

Na forma que vai se desconstruindo o modelo da família, vão se introduzindo ideias nocivas de ideologias e coisas parecidas. Que vão trazendo a impossibilidade do sujeito se tornar um pouco mais contido um pouco mais pacífico, um pouco mais tolerante dos desconfortos. Parece que a gente vai assistindo uma formação de um sujeito, de um humano revoltado, de um humano violento, hostil, porque ele vai sendo abandonado em instituições, em creches muito cedo, ele vai sendo colocado aos cuidados de terceiros muito cedo. Então, ele vai se tornando um sujeito cada vez mais distante da realidade e vai ficando cada vez mais incapaz de criar uma relação afetiva com a realidade, porque ele é abandonado muito cedo distante da realidade e isso vai dificultando que ele possa se tornar um animal mais pacífico, mais calmo mais tolerante. Pelo contrário, ele vai se tornando um sujeito agressivo, reclamão, ativista. Ao avesso daquele que pôde contar, por exemplo, com uma estruturação de uma família tranquila, com uma mãe que pudesse cuidar dele dedicadamente, com um pai que pudesse resguardar esse lar de maneira pacífica, de maneira afetiva, carinhosa. Essa sociedade que vai sendo configurada dessa forma desestruturante. A desvalorização da figura paterna, da função paterna. A desvalorização até, dos cuidados maternos, como se não tivesse importância que qualquer outra pessoa pudesse estar com essa criança nos primeiros anos de vida.



terça-feira, 12 de março de 2024

LEMBRANÇAS, EXPECTATIVAS E RECONHECIMENTO - Prof. Renato Dias Martino




MEMÓRIA E IMAGINAÇÃO

Aquilo que a gente se lembra, aquilo que que a gente resgata enquanto dados armazenados na memória está muito próximo do daquilo que a gente cria. Muitas vezes, se confundem. A gente tem uma dificuldade muito grande de prestar atenção nas coisas. Quando a gente olha para alguma coisa, quando a gente vive alguma coisa, a maior parte da nossa percepção disso diz respeito a uma tentativa de aproximar isso de algo que a gente já viveu. Então, o que a gente lembra não é o que ocorreu, mas é aquilo que a gente imagina ter ocorrido.

EXPECTATIVAS 

A expectativa é a fonte das frustrações. O futuro nunca vai ser da forma como a gente deseja, como a gente espera que seja. O futuro é mistério, o futuro é incerto. E quanto mais a gente conseguir rebaixar as nossas expectativas... Não é, não criar expectativas, não dá para não criar expectativas. A gente vai criar expectativa naturalmente, mas o importante é ser capaz de rebaixar essas expectativas. Não cultivá-las, não incentivá-las. Quanto mais a gente conseguir rebaixar, mais de acordo com a realidade a gente vai estar.

PRESENTE

Aquele que consegue viver o presente é agraciado, porque nós temos uma dificuldade muito grande de viver o presente. Porque o presente não admite o conhecimento. Você não pode conhecer o presente. Você pode, no máximo, vivê-lo, se você tiver de bem consigo mesmo. E isso é desconfortável. Lidar com algo que não pode ser conhecido só pode ser vivido.




terça-feira, 5 de março de 2024

DO ÉDIPO AO SUPEREGO - Prof. Renato Dias Martino



Quando a gente fala de Édipo, normalmente a gente tem a ideia de que existe ali, uma triangulação onde duas figuras estão unidas e vem uma terceira para cortar esta relação. Esta colocação é extremamente inadequada. 

CORTE, TRANSFORMAÇÃO E ENRIQUECIMENTO 

A entrada do pai não promove corte algum, ele vai promover um enriquecimento, ele vai vir para trazer uma possibilidade de influência para que esta relação, entre o filho e a mãe possa se enriquecer, possa se transformar. É um ponto de transformação e não de corte. Os lacanianos se apossaram dessa palavra corte, castração e trazem uma um empobrecimento na possibilidade de associação do que se tem como teoria, na prática. A entrada do pai é um fator enriquecedor, que vai possibilitar a desobstrução da relação filho e mãe, para que esta relação possa se transformar em algo adequado. Então, quando a gente está falando de triângulo edípico, nós estamos falando de uma configuração que vem para trazer uma possibilidade de transformação e não de ruptura. O vínculo entre mãe e filho se enriquece com a entrada do pai.

NOVA DIMENSÃO E ADEQUAÇÃO

Todas as configurações triangulares que o sujeito virá experimentar no futuro, vão estar de alguma forma subordinadas à elaboração daquilo que o Freud chamou de complexo de Édipo. O Freud trouxe o mito de Édipo, mas você não precisa do mito de Édipo para que você possa entender a configuração triangular. O próprio triângulo, a própria geometria já é o suficiente para que você possa perceber aí, dois pontos e um terceiro ponto que promove, não um corte, mas uma nova dimensão para esta configuração. O ponto não corta, ele traz uma nova configuração. A entrada da função paterna precisa ser algo enriquecedor para relação. Ele traz a possibilidade de enriquecer o relacionamento que o filho tem com a mãe. Ele traz a possibilidade de se esclarecer as possibilidades vinculares entre filho e mãe. A função paterna real e saudável é aquela que traz a possibilidade de adequação da relação filho e mãe.


PARA KLEIN


Irá ganhar uma nova configuração por conta da função paterna que passa a integrar o mundo emocional-afetivo da criança. Para Melanie Klein, o complexo de Édipo já existia dentro daquilo que ela chamou de um Édipo arcaico, de um proto-superego, por assim dizer. Um período pré-edipico que na fase fálica vai tomar uma configuração exteriorizada, por assim dizer. Como é que se dá esta configuração pré-edipico, no que a gente vai chamar de superego arcaico, dentro da configuração kleiniana? Melanie Klein, dentro daquilo que ela chamou de posição esquizoparanóide, divide o bebê. Vai dividir a realidade em duas, cindindo essa realidade em dois. Uma parte é benevolente, uma parte vem para satisfazer e a outra parte está ligada à privação e é um seio persecutório. Então, seio bom e seio mau. O seio bom é aquele que vem e satisfaz e o seio mau é aquele seio que priva da satisfação. Por mais que o sujeito esteja desfrutando do seio bom, ele está o tempo todo com medo da perseguição do seio mau. Então, se a gente está falando de sei o bom e sei o mau e o sujeito, nós estamos falando então, de uma triangulação. O superego primitivo, ou arcaico é um superego persecutório, é aquele perseguidor, é aquele que que vem ameaçar a paz do bebê com o seio bom. Diferente do superego proposto por Freud na fase fálica que é o herdeiro do complexo de Édipo fálico, que é o superego legislador. É aquele que traz a lei, é aquele que vai trazer o que pode e o que não pode. A princípio, o bebê vai viver um superego persecutório e depois ele vai, através da entrada do pai, transformar esse superego num superego legislador. O sujeito que tem a preponderância, ou a predominância da parte psicótica, não conseguiu essa transformação de superego persecutório para um superego legislador. O superego legislador é aquele que vai ser o fiscalizador, ou o fiscal das neuroses, dos sintomas neuróticos e o superego persecutório é aquele que vai atormentar as alucinações psicóticas.

PARA FREUD

Para o Freud, o superego é um herdeiro do complexo de Édipo e para o Freud o complexo de Édipo acontece na fase fálica. Então, na elaboração do complexo de Édipo na fase fálica, para Freud, aparece o superego para ele. Antes não tinha superego e o que que é o superego para o Freud é a possibilidade de elaboração do complexo de Édipo. As questões edípicas. Ideal de eu. O que então, deveria ser. Então, este superego, ao mesmo tempo vai cobrar que o sujeito tem a mãe só para ele e também, ao mesmo tempo, vai negar e proibir que ele possa ter esta mãe para ele. E quando esse pai não exerce uma função suficientemente boa, isso passa a ser um elemento extremamente perturbador na configuração da estrutura mental do sujeito.

PERSEGUIÇÃO E LEGISLAÇÃO

Um sujeito que tem a predominância da parte psicótica da mente, ele não tem a ligação razoável com o mundo externo, logo, as leis para ele fazem muito pouco sentido. Toda figura de autoridade vai significar perseguição e não legislação. Todas as vezes que houver um contato, tanto com a figura externa de autoridade, quanto com a figura interna de autoridade. Este contato será um contato de perseguição de alguém que vem me sondar com um olhar que fica o tempo todo à espreita. A alucinação do psicótico, a miúde, tem esta figura de perseguidor independente de leis ou não. Não tem a ver com lei, tem a ver com perseguição. Estão me perseguindo! E o superego legislador é mais fácil ainda, porque todo o sintoma neurótico acontece por conta de uma proibição, de uma proibição da civilização. Como é que se desenvolve um sintoma neurótico? O sujeito reprime um desejo perverso, por ser proibido civilizatoriamente, dizendo, e a partir dali, ele elege um substituto, que é permitido pela sociedade e ali ele desenvolve o seu sintoma. Todo o sintoma neurótico perpassa por uma proibição civilizatória social.

PARA BION

O Bion observa um uma outra característica do Édipo. Não restrita a ideia do crime sexual e do parricídio, mas ele vai para além. Ele percebe ali, a forma arrogante que o Édipo lida com a verdade. Quando ele manda buscar o Tirésias e pergunta quem foi que matou Laio. Conforme o Tirésias vai revelando ali a verdade, o Édipo vai se enfurecendo, ficando hostil e lidando com arrogância frente essa verdade. Mesmo dentro do Édipo, fora dessa configuração, se estabelece mais um triângulo. Não mais em relação a Laio e Jocasta, mas agora em relação à verdade e o Tirésias. Então, mais um triângulo aí que não tem a ver com sexualidade. Mas o Édipo gostaria que a realidade fosse uma coisa e o Tirésias traz a verdade que não é aquilo que o Édipo gostaria que fosse. Então dentro da história do Édipo se instala um novo triângulo que é uma extensão do próprio triângulo edípico, onde o Édipo deseja que a realidade seja alguma coisa e o Tirésias diz que a realidade não é aquilo que ele deseja.

MODELO EDÍPICO

Quando a gente fala de triângulo edípico, triangulação do Édipo, do complexo de Édipo, nós não estamos falando somente da ideia sexualizada, mas nós estamos falando aqui, de uma experiência onde há um objeto de desejo e algo a ser respeitado na tentativa de conseguir este objeto de desejo. O sujeito, um objeto de desejo e algo que precisa ser respeitado na direção de conseguir este objeto de desejo. Não somente, sujeito, mãe e pai. Ou sujeito, pai e mãe, mas sujeito algo que ele deseja e algo que barra a realização desse desejo. Então, este é um modelo que vai para além da simples triangulação no desejo da criança obter a mãe exclusivamente para ele e excluir o pai desta relação.


domingo, 25 de fevereiro de 2024

AFINIDADES - Prof. Renato Dias Martino


Quando o sujeito não vive vínculos saudáveis que sejam nutridos de amor e de verdade ele tende a adoecer. Para ele nutrir um vínculo saudável consigo mesmo ele precisa estar se vinculando a pessoas que possam também nutri-lo desta forma. Que possam nutri-lo desses elementos. De amor e verdade. Quando o sujeito convive num ambiente que ele não pode estabelecer vínculos que tragam para ele amor e sinceridade ele tende a adoecer emocionalmente. A afinidade que se tem com o outro é a manifestação de que esse vínculo é saudável e conviver em ambientes onde não se tem afinidade é adoecedor.

AMOR E SINCERIDADE 

O vínculo de afinidade é aquele que traz amor e sinceridade. A palavra afines, ela diz respeito a algo que finda, que termina, ou seja algo que mostra um limite, entre o eu e o outro. Quando existe essa possibilidade do sujeito perceber o seu limite, reconhecer o seu limite e logo reconhecer o limite do outro, se estabelece um vínculo de respeito e afinidade entre duas pessoas. E quando eu falo afinidade, eu não estou falando de afinidade de coisas materiais fúteis ou banais, eu estou falando de afinidade no funcionamento emocional e afetivo. De você perceber que o outro funciona afetivamente como você. Se liga a você de maneira sincera. Se liga você de maneira afetiva e com sinceridade. Manifestando o limite que existe ainda.

IDENTIFICAÇÃO

Gostei daquela pessoa porque eu me identifiquei com aquela pessoa. Você se identificou com aquela pessoa, quer dizer que você se confundiu com ela. Uma ligação saudável precisa transcender a identificação que você se confundiu, se misturou com ela e expandir para uma afinidade porque a gente percebeu o limite entre o eu e o outro. AFINES quer dizer limite.


terça-feira, 20 de fevereiro de 2024

EGO E DESAPEGO - Prof. Renato Dias Martino



O ego, ele é constituído por símbolos e os símbolos são formados através de experiências de desapego. Quando o sujeito é capaz de se desapegar de alguma coisa do mundo material, ele conseguiu uma “expansãozinha” no seu ego. Cada elemento que ele é capaz de dispensar a confirmação sensorial no mundo material, ele ganhou uma nutrição no seu ego. Quando o bebê é capaz de simbolizar a mãe, isso quer dizer que ele pode tolerar a ausência desta mãe material, física, concreta, porque ele consegue ter esta mãe dentro dele, conseguiu internalizar a imagem dessa mãe, logo, o ego dele foi nutrido. Logo, o ego dele começa a ser bem estruturado.

O EGO E O OUTRO

O sujeito que tem um ego bem estruturado, o sujeito que tem um ego nutrido, ele tem a característica da união, da junção, do acolhimento. Primeiro, de si mesmo e depois do outro. O ego é a parte da personalidade que organiza o funcionamento emocional e afetivo. Então, quanto mais bem nutrido o ego do sujeito estiver, mais capaz de se doar ao outro e ele será. Porque ele é capaz de doar-se a si mesmo, de confiar em si mesmo, de acreditar em si mesmo, de amar a si mesmo, de respeitar a si mesmo. Este é o ego. É a capacidade de estar de bem consigo mesmo. É a autoestima e esta autoestima quando bem nutrida se desdobra na estima do outro

EGO INFLADO 

Muitas vezes, quando a gente vê um sujeito manifestando uma característica que não inclui o outro, uma característica que a gente vai chamar de narcisista, isso não quer dizer que o sujeito tem um ego muito grande, quer dizer que o sujeito tem um ego inflado. Ego inflado não é um ego nutrido, ego inflado é um ego oco, que não tem nada dentro. Ego nutrido é um ego consistente. Quando, o sujeito tem um ego consistente, ele é um sujeito que é capaz de se compadecer com o outro. Então, muitas vezes, esse sujeito, o que ele tem muito grande é um superego, é um ideal de eu, é algo que exige que ele seja algo que ele não está sendo. O ego é aquilo que ele está sendo, o superego é aquilo que ele deveria ser e muitas vezes para conseguir aquilo que ele deveria ser, ele passa por cima do outro. Ele tem uma ideia de si mesmo, não por aquilo que ele está sendo, mas por aquilo que ele deveria ser e ele começa a tentar reafirmar isso que ele deveria ser, como se ele estivesse sendo, para o outro, de uma maneira impositora, muitas vezes sendo arrogante, prepotente.

ESTAR SENDO E DEVERIA SER

A gente tem o hábito de condenar o superego, condenar o ideal de eu. Ah, mas o meu superego é muito rígido, ele exige demais de mim. “Ah, mas meu ideal de eu é muito exigente, ele é muito severo!” Na realidade, o que está acontecendo é que você não está sendo capaz de acreditar em você mesmo. Você não está sendo capaz de acreditar naquilo que você está sendo. Então, o que vai te guiar é aquilo que você deveria ser, logo o ideal de eu, superego. Então, o vilão da história não é o superego. Ele está ali, para tentar administrar alguma coisa que você, enquanto estando sendo, não está dando conta de administrar. Todas as vezes que você não estiver acreditando em você mesmo, quem vai tomar conta do da sua vida é o “deveria ser”, é a exigência é a cobrança.

EGO E SOLIDÃO

Quando o sujeito é capaz de ficar sozinho, ele tolera a solidão, ele se qualifica para conviver com o outro de forma saudável. Quando o sujeito não tolera a solidão, não tolera ficar sozinho, ele está fadado a se tornar uma pessoa solitária, mesmo na presença dos outros. Então, o que qualifica o sujeito a conviver com as pessoas, a estar junto com as pessoas é a capacidade de estar sozinho consigo mesmo. O sujeito, muitas vezes, não tolera a sua própria companhia, ele não é uma boa companhia para si mesmo. Desesperadamente, precisa de alguém do lado dele e muitas vezes, esse alguém está do lado dele, não está do lado dele, na realidade. Está ali, fisicamente, mas emocionalmente e afetivamente, não está.

FUNÇÃO DE AMAR

É do Ego a função de amar. Só aprende a amar o outro aquele que ama a si mesmo e o amor que se tem para consigo mesmo coincide com um ego bem estruturado e bem nutrido. Sem um ego bem estruturado e bem nutrido o sujeito não é capaz de amar o outro. A definição mais próxima do que é ego, é a parte da personalidade que aprendeu com o amor do outro como é amar a si mesmo. O outro me amou, eu aprendi a me amar. A partir desse amor próprio, eu posso estender para o outro, eu posso me doar ao outro.

AMOR E EGOÍSMO

Lá em SOBRE O NARCISISMO: UMA INTRODUÇÃO, de 1914, o Freud coloca: “Um egoísmo forte constitui uma proteção contra o adoecer.”. Por que que ele fala isso? Porque, muitas vezes, você está implicado ali, envolvido num vínculo tóxico e você precisa de um egoísmo forte para te proteger desse vínculo tóxico. O Freud continua: “mas num último recurso devemos começar a amar a fim de não adoecermos.” Ou seja, depois de conseguir se distanciar desse vínculo, nós precisamos voltar a o exercício do amar, de se dedicar ao outro. E aí, ele continua: “estamos destinados a cair doentes se em consequência da frustração, formos incapazes de amar.” Categoricamente, o Freud coloca que, aquele sujeito que não está sendo capaz de amar, está fadado a cair doente emocionalmente e afetivamente.

VÍNCULO SAUDÁVEL 

Um vínculo saudável, um vínculo bem nutrido, um vínculo bem estruturado, impreterivelmente, precisa contar com dois elementos. Com amor e com sinceridade. Este amor é a doação e esta sinceridade é o limite para esta doação. Então, esses dois elementos juntos constituem a possibilidade de se estabelecer um vínculo saudável. A capacidade de renunciar a si mesmo pelo outro, mas dentro da sinceridade que vai trazer o limite do que isso é possível. Aí se estabelece um vínculo saudável.

EGOÍSTA FERIDO

Muitas vezes, o sujeito que manifesta características egoístas, na realidade, é um sujeito que está com o ego machucado, fragilizado, ou ainda, que este ego é um ego imaturo, que não conseguiu amadurecer. Quando o sujeito está manifestando características egoístas é porque o ego dele está precisando de cuidado. Mas quando se trata de um adulto, isso começa a se confundir, porque muitas vezes, ele não é capaz de pedir ajuda para isso. E aí, ele se manifesta de uma maneira arrogante, prepotente para se defender da sensação de ser alguém menor que o outro.

CORAGEM E AJUDA

Talvez a atitude mais corajosa que possa existir dentro do âmbito emocional e afetivo seja pedir ajuda ao outro. Muitas vezes, ele não tem coragem disso. “Cor + agem”. COR coração e AGEM ação. Ele não consegue agir pelo coração. Porque a razão dele diz assim: “Você não pode ficar pedindo ajuda. Você não pode dar o braço a torcer que você não consegue fazer as coisas sozinho.” E aí, ele se torna um sujeito arrogante e não age pelo coração.





quinta-feira, 15 de fevereiro de 2024

CATIVAR, SIMBOLIZAR E CONTEMPLAR - Prof. Renato Dias Martino



As três etapas da simbolização, que vai acontecer com o bebê, mas vai se estender como um funcionamento para a vida toda no adulto. Experimentamos de uma realidade concreta, de uma realidade física, de uma realidade sensorial, onde existe uma necessidade concreta, uma necessidade sensorial e existe um objeto concreto e sensorial no mundo externo, que vá suprir essa necessidade. Experimentamos, uma realidade concreta, uma realidade abrangida pelo sensorial, num segundo momento, no afastamento desta realidade sensorial, vamos viver uma imaginação sobre isso que não está presente naquele momento. Preciso de alguma coisa e esta coisa é concreta, é física e neste momento, esta coisa física e concreta não está presente, então, eu imagino sobre isso. Este é o real Imaginário. Se a relação que eu tive com este objeto real e concreto, foi bem-sucedida, esta imaginação vai me levar para a simbolização. Ou seja, eu internalizei este objeto concreto e por ter internalizado, por ter simbolizado este objeto, eu sou capaz de tolerar a ausência deste objeto que um dia foi concreto, imaginário. Isto se chama uma simbolização para psicanálise.

EU

Quando a gente fala de doação, de doar-se, de renunciar para o outro, antes a gente precisa estar de bem com a gente mesmo, antes a gente precisa ter sido nutrido o suficiente, antes do nós existe um eu. Então, eu não posso considerar o nós se eu não tiver de bem comigo mesmo. Eu preciso estar de bem comigo mesmo, para que eu possa estar de bem com o outro. Eu preciso amar a mim mesmo, para que eu possa amar ao outro. Eu preciso estar respeitando a mim mesmo, para que eu possa respeitar o outro. O ego é fundamental para que eu possa ter uma estrutura suficiente para me doar para o outro. Se o meu ego não estiver nutrido e bem estruturado, eu não consigo estender qualquer que seja a ação nobre para o outro.

LUTO E CONFIANÇA

O bom desenvolvimento da personalidade depende fundamentalmente, de ter vivido experiências bem-sucedidas com as pessoas e que estas experiências bem-sucedidas possam nutrir o eu nutrir o ego. Esta é a base de uma personalidade bem estruturada. O luto é fundamental! Quando se vive uma experiência bem-sucedida com um objeto externo e aqui objeto externo estou falando sobre pessoas vincula-se pessoas, quando essa pessoa se afasta, ela deixa recordações dessas experiências bem-sucedidas e essas recordações nutrem o ego. O sujeito vai ficando autoconfiante na medida em que ele sente que o outro confiou nele e ele pôde confiar nesse outro.

CATIVAR E ENTRISTECER 

A raposa do Pequeno Príncipe explica para ele o que quer dizer cativar. Quer dizer criar laços, quer dizer passar a ser necessário para o outro. Um precisar do outro. Um ser singular para o outro. Este é o primeiro passo da experiência. Primeiro cativa-me, depois inicia-se um processo de expansão do vínculo. A experiência da simbolização, a experiência do cativar, inclui a tristeza, inclui o entretecimento. É necessário se entristecer para simbolizar. Se eu evito o sofrimento, se eu evito o entretecimento, eu não consigo simbolizar. Para ter recordações, eu preciso ter perdido o objeto da recordação e isso é triste. O sujeito que não tolera se entristecer, ele não simboliza, ele não cativa, ele não vive.

EQUAÇÃO OU ANALOGIA

A Hanna Segal, ela traz a ideia da equação simbólica. O que que ela chama de equação simbólica? É a relação que o bebê tem com a mãe, enquanto a mãe ainda não está simbolizada. A mãe real, concreta, física a mãe do mundo externo e a mãe que está dentro dele coincidem, equacionam-se. Quando uma sai, a outra deixa de existir. Quando uma se ausenta, a outra deixa de existir. O bebê não é capaz de ter uma imagem internalizada da mãe, até então, para que possa sustentar a ansiedade e angústia da ausência dessa mãe. Aos pouquinhos ele vai simbolizando esta mãe. A partir das experiências bem-sucedidas que ele teve com essa mãe, ele vai simbolizando essa mãe. O que que é simbolizar? É introjetar experiências bem-sucedidas e sustentar-se na ausência dessa mãe com as recordações que ele tem dela. Então, a parte partir daí, este símbolo é como se fosse a mãe e aí a gente expande pra ideia da analogia simbólica na equação simbólica. “Isso” é “isso”. Se “isso” não existe, “isso” também não existe. Na analogia simbólica, “isto” é como se fosse “isso”. Então, se “isso” não está, “isso” sustenta a ausência “disso”. Porque “isso” é como se fosse “isso”. Dentro de um desenvolvimento do processo psicoterapêutico, o paciente pode viver de início a sensação de que a analista é a mãe dele, que o analista é o pai dele, ou que o analista é a mãe dele e quando ele está longe do analista ele sente uma angústia muito grande, porque quando ele está numa situação difícil ele não sabe o que fazer. Ou seja, ele vive uma equação simbólica. Aos pouquinhos ele vai internalizando as experiências que ele vai vivendo dentro do setting terapêutico e aí ele vai vivendo uma analogia simbólica.

ANALOGIA E RECORDAÇÃO

Não é só dentro do processo psicoterapêutico. Quando o sujeito começa por exemplo, um relacionamento amoroso, quando ele começa a se relacionar efetivamente com uma pessoa, ele vive isso também. No princípio, ele não consegue simbolizar esta pessoa e quando essa pessoa sai de perto, ele fica desesperado. Chama no WhatsApp e a pessoa não responde, liga e ela não atende e ele se desespera. Ou seja, ele ainda não tem essa imagem internalizada, ele ainda não conseguiu guardar experiências bem sucedidas com essa pessoa o suficiente para ter recordações desta pessoa. Recordar. “Re”, de novo, “cor”, coração e doar. Experiências que possam ser novamente dadas ao coração. Aos pouquinhos com vivências bem-sucedidas com esta pessoa, ele vai conseguindo simbolizar. E aí, ele vai conseguir fazer analogias simbólicas.

IDENTIFICAÇÃO

A ausência do outro é a ausência de mim mesmo. Porque existe ali, uma relação por identificação. Assim como Freud nos propôs, esta relação por identificação acontece quando o outro não é outro. O outro é um pedaço de mim e aí se o outro se ausenta é como se tivesse arrancado um pedaço de mim.

MELANCOLIA 

Por outro lado, quando a gente não consegue viver experiências bem-sucedidas e a gente perde o objeto sem poder ter vivido experiências bem-sucedidas com este objeto, o sujeito passa a olhar o mundo com maus olhos. Ele passa a ser uma pessoa invejosa, desgostosa, obstruída de contemplação.

SIMBOLIZAÇÃO E CONTEMPLAÇÃO

Quando o sujeito é capaz de viver a experiência da simbolização, quando ele é capaz de viver a experiência do cativar, assim como ensinou a raposa ao Pequeno Príncipe, ele enriquece não só o ego, mas ele se enriquece da contemplação do mundo. Porque esta recordação das experiências bem-sucedidas que ele teve com o objeto vai fazer com que ele olhe para o mundo externo e consiga contemplar o mundo externo de uma forma que ele não fazia anteriormente. Então, a raposa não ligava para os campos de trigo, mas depois de ter cativado o principezinho, ela olhava para os campos de trigo e se lembrava dos cabelos dourados do principezinho. Ou seja, ela não contemplava os campos de trigo e depois da experiência bem-sucedida da simbolização da relação com o principezinho, ela passou a contemplar os trigos.